segunda-feira, janeiro 07, 2008

Vovó Tida


Antes do meu pai era a minha avó. Agora, antes da minha avó, vivo eu a pensar sozinha, o que seria de mim sem essa heroína mor e o grande herói de todo meu tempo – papai.

Nos cantos da minha infância, sinto nas esquinas de hoje algumas sobras de minhas sombras. Basta eu forçar as pálpebras e deixar encostar os grandes cílios entre os pequenos. Libertar as lembranças de um passado abastarda pelo tempo em minha mente. Saio nesse instante a refazer meus interiores, das paredes caiadas às broas de fubá de canjica. O gosto é o prumo da sensação unido ao exalar do cheiro.

As mãos macias e enrugadas sempre me deram a curiosidade de como as envelheceram. Há 20 anos seus cabelos já eram brancos, suas costas sempre foram encurvadas pela labuta de diversas criações. Tinha passado 70 primaveras, outonos, verões e alguns tenebrosos invernos. E não era tudo aquilo que estava ali. Era mais. Conta-se a força de um homem através dos sinais de seus estigmas. Conta-se a força de minha senhora nos sinais de suas rugas. Vovó nunca passou pela prova da modernidade, sua estética é provar por A mais B com quantas letras se faz um poema. Ela nasceu da poesia.

Hoje aos 90 anos, vejo a velhinha que sempre costurou que sempre cozinhou que sempre se cuidou. Costurou as roupas de toda uma vida, cozinhou os alimentos de toda uma família e cuidou de um Pacífico abraçando um Oceano. A vaidade é vista por suas gavetas, das toalhas confortadas com cheiro de erva doce. Dos pontos bem feitos em seus teares importantes. De todos os retratos expostos em suas cômodas. Em cada neto uma lembrança de sua benção. Em cada filho um botão de rosa florescido. Atrás do rosto robusto e singelo, sempre existiu uma mulher de força, fúria e fé. A quem teve coragem de enterrar um marido. A quem teve coragem de enterrar três filhos. A quem teve coragem de enfrentar uma vida de espinhos e fazer dessa mesma vida um palco de piadas. A quem tem coragem de viver 90 anos.

A essa mulher, que eu muito estive ausente, reflito nela hoje presente com toda satisfação e orgulho de tê-la como a mãe do meu pai. E poder sentir o que é ser uma mulher com coragem.

Um comentário:

Bruna Costa disse...

Olá!

gostei mto do seu blog!

bjs!